terça-feira, 20 de outubro de 2009

Sino

A corda acorda
A gente que dorme
Puxando o sino
Seu som uniforme
Em baixo em cima
O sino timbra
Em baixo em cima
Em baixo em cima
Em baixo em cima.
O sino é sinal
De algo
Assim como as algas
Assim como as águas
Há milhares
De sinas
Trás os montes
Acordaram condes
Acordaram reis
E os vilarejos
E os reinos
Sem sino
O Rei ordenava:
- Em seu cavalo, montes!
E traga um sino!
Após buscado
Balançava
Em baixo em cima
Em baixo em cima
Em baixo em cima.
Não achado
O sino tornava-se
Algoz
Mas resta a voz
E o povo grita
Em baixo em cima
Em baixo em cima
Em baixo em cima.

sexta-feira, 16 de outubro de 2009

A Parente da Mulher do Meu Tio

Não sei se lhe chamo amor ou paixão:
aquela parente da mulher do seu tio
que a gente conhece ao menos uma vez na vida...
Em uma semana tornamo-nos enamorados
e depois vamos embora
Adeus, até algum dia.

Mas antes de ir criamos planos
esperando nos reecontrar no próximo verão...
que nunca chega, ou chegará.

Nos gostamos tanto
Nos sentimos tanto
mas no fim só resta o desencanto.

A gente até tenta
Bola um plano, inventa
Mas o tal verão não chega.

O tio se separa da mulher
A menina se descobre mulher
(e a descobrem, isso é o principal).

A namorada que a gente quer reencontrar
Que a gente bola plano para rever:
Paris, a parente da mulher do meu tio, minha eterna enamorada.

Até o nosso verão.

quarta-feira, 14 de outubro de 2009

Dissociador

Pensamento
É o inicio de tudo
Disseque-o, um ressecamento
Não converse nem consigo, fique mudo
Songes et mensoges dar-te-ão o agradável torpor
O torpor da ausência, tão comum em nossos adoráveis dias
Tu pleures, tu mens, e eu acredito, ton soleil, no meu colo teu calor
Agora vem, junte-se aqui, venha curtir o seu, o nosso, em dans me bras.

terça-feira, 13 de outubro de 2009

Agudo

Quando não se tem vontade
nem o aroma da tarde
podemos sentir.

Quando não se tem por onde
nem brincar de esconde-esconde
para se divertir.

Quando não se tem amizade
nem a saudade
pode nos invadir.

Quando não se tem amor
nem a real dor
podemos inferir.

Quando não se tem um dia chato
o legal torna-se pacato
demais para sorrir.

Quando não se tem um prato
comida é abstrato
nem por nós podemos expelir.

Quando não se tem vontade
não se tem por onde
não se tem amizade
não se tem amor
tem-se um dia chato
sem comida, sem resto, sem prato...

quarta-feira, 7 de outubro de 2009

Antologia Poética, com novos ares, Vinícius de Moraes

Meu Deus, eu quero a mulher que passa!
Não sois Loélia tenebrosa
Nem sois Vanda tricolor
1º nome de amada:
Ariana, a mulher – a mãe, a filha, a esposa, a noiva, a bem-amada!
Vagabunda, patética, indefesa
O demônio em todas as idades:
Uma cadela.
Nós nos possuiremos
Longe dos pescadores
Entre os amigos num bar
Vestida de Tangolomango
(No mundo há tantos amantes)
As nádegas crispadas no desejo
Que pensas usted que saiu?
Uma gota de leite no teu seio
Nas ondas de tua saia
Como se fosse de chumbo
E a angústia do regresso morava já nos olhos teus
Depois foi o sono, o escuro, a morte
Toda a afeição da ausência.

Dança, ó desvairado!
-Canta, Rouxinol!
Porque cantar é a missão do poeta
E o gosto ardente de morrer
De sede lentamente
Tomo um porre danado que você vai ver:
Mijaremos em comum numa festa de espuma
Et nunc et semper
Mas que seja infinito enquanto dure.

De repente, não mais que de repente
Um rio nasceu
(Porque hoje é sábado)
E o velho celo sorriu!

sexta-feira, 2 de outubro de 2009

Nome

I-

A poesia veio, mas será que vinha por esse caminho?
Ou veio abrindo salão aqui, abrindo salão lá?
O importante: está aqui.
(Iluminemos-na)
Luz, Luz, Luz!
Cai do céu, amansa leões, feito Daniel.
A poesia se dá pela dimensão:
Luiz
Daniel
Vinha
Absalão.

II-

Entrou pelo salão Absalão.
Com seu ar de poder, ar de Rei
de todos recebeu uma grande salvação
Vinha acompanhado de um fragmento
Pronunciando com sentimento:
A história dos leões e Daniel.
Lido, parou e olhou o céu...
Uma luz muito forte o cegou:
Cego Absalão.
Vinha pelo caminho errado, bamba.
Luiz para todos.
Daniel, contraste de significado.

III-

Já pensou que seu nome
é uma cópia de outro
que se sujou em esgoto
que detritos ferozmente come?

Te conhecem por esse mesmo nome:
Luiz; XIV
Daniel; Dantas, da Rússia, Salamanca.
Vinha; Deu sorte...
Absalão; Roubar o poder do próprio Pai...

Não fique triste, há mais de ter orgulho:
Luiz; Gonzaga, Inácio, Vaz de Camões, Fernando Verissimo.
Daniel; Auteil, DeVito, Defoe, Fahrenheit, Jack.
Vinha; Vinho.
Absalão; Tinoco Neto.

quinta-feira, 1 de outubro de 2009

A Terra que encontrei.

Hoje a terra dos sonhos encontrei
Uma terra melhor que Pasargada:
Nesta terra não há Rei
Há, sim, uma democracia eficiente
Na qual até os loucos e falsos dementes
Têm voz nas discussões
Lugar onde contra-parente
Ganha emprego, somente por mérito, nas repartições.

Lá a vida é uma alegria:
Não há vontade de anti-concepção
As crianças magras, gordas, fracas, esguias
Juntas qual uma comunhão
Mas lá, Graças a Deus, não há religião
Como a intensidade da luz do dia
A ciência é que traz a verdade
Não algum livro de longínqua idade.

Quantas postretrutas bonitas
Louras, polacas, mulatas
Com um fogo de inflamar carreata!
Em contraponto há mulheres pra casar:
Fiéis, infiéis, bravas, resignadas
Bonitas, feias, gordas, saradas
Que maravilha de lugar!

Onde a educação é tão valorizada
que a Faculdade de Medicina
Alcançou a cura da AIDS de minha amada!
Uma senhora que ronda os cem anos, na escola, ainda ensina:
Jovens de olhos atentos
Absorvendo o máximo de ensinamento
Mamãe, na USP doutora
Lá também quer ser professora!

Contei a todos dessa terra
Disseram que era inexistente e idealizada:
Quiseram me internar
Gente mal-criada
É tão simples lá chegar:
O bom negro e o bom branco
Da nação Brasileira
No futuro, in loco, irão comprovar.